Dr. Arnaldo Schizzi Cambiaghi
Especialista em Ginecologia e Reprodução Humana – IPGO
Você sabia que o sono pode interferir na sua fertilidade?
Quando pensamos em fertilidade, logo vem à mente hormônios, ovulação e idade. Mas tem um fator que é muitas vezes ignorado — e que pode fazer toda a diferença: a qualidade do seu sono.
Estudos recentes mostram que dormir mal ou dormir pouco pode prejudicar a saúde dos seus ovários, diminuir a reserva de óvulos e até reduzir as chances de sucesso em tratamentos de fertilização in vitro (FIV).
O que dizem os estudos?
Três pesquisas importantes, publicadas em revistas científicas de grande prestígio, investigaram a relação entre sono, fertilidade e FIV. E todas chegaram à mesma conclusão: o sono ruim tem impacto direto na função ovariana.
Índice
ToggleVamos aos dados:
1. Mulheres que dormem mal têm menor reserva ovariana
Um estudo com mais de 1.000 mulheres publicado na revista Fertility and Sterility (2025) mostrou que:
- Quem tem sono de má qualidade tem níveis mais baixos de AMH (hormônio que indica a reserva de óvulos);
- Também tem menos folículos antrais no ovário (indicador direto da quantidade de óvulos);
- E apresenta FSH mais alto, sinal de que o organismo está se esforçando mais para estimular os ovários.
Mas o mais importante:
Dormir menos de 7 horas por noite já é suficiente para causar esse impacto negativo, mesmo que a mulher não se sinta cansada.
2. Dormir mal pode diminuir pela metade a chance de engravidar na FIV
Outro estudo, feito na Itália e publicado no Scientific Reports, avaliou 263 mulheres que estavam em tratamento de FIV.
O resultado foi claro:
- As que dormiam mal (com pontuação alta no teste de qualidade de sono) tiveram metade da chance de engravidar em comparação com as que dormiam bem.
E o curioso: ansiedade, estresse ou depressão não afetaram o resultado da FIV com a mesma força que o sono ruim.
3. Dados de grandes populações confirmam: sono ruim pode antecipar a menopausa
Estudos com milhares de mulheres dos EUA e Reino Unido (NHANES e UK Biobank) mostraram que:
- Quem dorme mal ou dorme pouco tem até 70% mais risco de entrar na menopausa antes dos 40 anos — o que chamamos de falência ovariana prematura.
Isso mostra que o sono afeta não só a fertilidade agora, mas também o tempo de vida útil dos ovários no longo prazo.
Mas afinal, o que é um “sono saudável” para a fertilidade?
- Dormir entre 7 a 8 horas por noite
- Ter um sono contínuo, sem acordar muitas vezes
- Não ter insônia frequente
- Não sentir muito sono durante o dia
- Ter horários regulares para dormir e acordar
Parece simples, mas na correria do dia a dia, muitas mulheres sacrificam horas de sono sem perceber os efeitos a longo prazo.
O que tudo isso quer dizer?
Se você está tentando engravidar — naturalmente ou com ajuda da medicina — precisa cuidar do seu sono tanto quanto cuida dos seus hormônios ou da alimentação.
Dormir bem não é luxo. É parte do tratamento.
E deve ser avaliado em todas as mulheres que desejam preservar ou recuperar sua fertilidade.
Conclusão prática (do jeito que eu gosto de escrever)
- Se você dorme mal ou menos de 7 horas por noite, sua reserva ovariana pode estar sendo afetada;
- Se está em FIV, isso pode reduzir suas chances de sucesso;
- Melhorar o sono é uma ação simples, barata e acessível — e pode ser um diferencial no seu tratamento.
Recomendações do consultório
- Estabeleça um horário regular para dormir;
- Evite telas de celular e TV antes de dormir;
- Reduza cafeína e álcool à noite;
- Se o sono não melhora, converse com seu médico. Existem estratégias simples que funcionam.
Exercícios que podem ajudar a qualidade do sono
Estas são as recomendações detalhadas do artigo da Medical News Today, para melhorar o sono por meio de exercícios:
Yoga
- Sessões recomendadas: de 2 a 6 vezes por semana, com duração de 45 a 60 minutos cada, ao longo de 1 a 4 meses.
- Benefícios observados:
- Aumento do tempo total de sono em quase 2 horas por noite.
- Melhora na eficiência do sono (~15 % a mais).
- Redução do tempo acordado após iniciar o sono em aproximadamente 1 hora.
- Queda no tempo de latência (demora para adormecer) em cerca de 30 minutos.
Tai Chi
- Frequência sugerida: de 2 a 3 vezes por semana, com sessões de 45 a 60 minutos, durante 3 a 4 meses.
Efeitos positivos:
- Aumenta o tempo total de sono em mais de 50 minutos por noite.
- Reduz o tempo acordado após iniciar o sono em mais de 30 minutos.
- Diminui o tempo para adormecer em cerca de 25 minutos.
- Os benefícios foram constatados por até 2 anos após o início da prática.
Caminhada ou Corrida Leve (jogging)
- Recomendação: praticar de 3 a 5 vezes por semana, entre 30 e 75 minutos por sessão, por 3 a 6 meses.
Resultados observados:
- Redução da severidade da insônia em quase 10 pontos nos sistemas de escore utilizados pelos estudos.
Outras observações importantes
- A análise incluiu 22 ensaios clínicos randomizados, com um total de 1.348 participantes, e comparou 13 abordagens diferentes para tratar insônia, incluindo as três modalidades de exercício acima.
- Dos estudos analisados, cerca de 68 % apresentaram falhas metodológicas ou tamanho reduzido da amostra, o que tempera a certeza dos dados.
- Os pesquisadores observaram que essas práticas são de baixo custo, acessíveis à maioria das pessoas, com efeitos colaterais mínimos, tornando-as atraentes inclusive para programas de saúde pública e de atenção básica como alternativa ou complemento à terapia padrão (CBT‑i).
1. Escolha conforme seu objetivo:
- Para dificuldade em dormir ou pouco tempo de sono, prefira yoga ou Tai Chi.
- Para quem está com fadiga, mau humor ou sonolência diurna, a caminhada ou jogging pode ser mais eficaz.
2.Pratique regularmente, com frequência e duração consistentes conforme os dados acima.
Justificativa científica
- Yoga e Tai Chi, por meio de respiração controlada, atenção plena e movimentos suaves, ajudam a diminuir a ativação simpática, reduzir ansiedade e facilitar a desaceleração mental à noite.
- Caminhada e jogging, além de gatilhos fisiológicos como melhoria do humor e equilíbrio emocional, atuam reduzindo o cortisol e elevando a produção de melatonina, promovendo sono mais profundo e reparador.
10 recomendações para ter um sono de melhor qualidade
Perguntas e respostas
Você pode refletir sobre sinais como: acordar cansado, ter dificuldade para manter-se desperto durante o dia, precisar de café para se manter ativo e acordar várias vezes durante a noite.
Sim, isso pode indicar que seu sono foi superficial, interrompido ou insuficiente, mesmo que tenha dormido várias horas.
Ter sono excessivo durante o dia, especialmente em momentos de repouso ou após refeições, pode ser sinal de que o sono noturno não está sendo restaurador.
O uso excessivo de cafeína pode ser um indicativo de má qualidade de sono. Além disso, seu uso em excesso pode piorar ainda mais o ciclo do sono.
Despertares frequentes prejudicam a continuidade do sono profundo e afetam a qualidade geral do descanso.
A exposição à luz azul dessas telas à noite inibe a produção de melatonina, prejudicando a indução e manutenção do sono.
Práticas como meditação, leitura leve, oração ou banho quente ajudam o corpo a relaxar e sinalizam ao cérebro que é hora de desacelerar.
Ambientes com luz, ruídos ou temperatura desconfortável afetam negativamente a qualidade do sono. O ideal é eliminar esses estímulos.
Ter uma rotina regular ajuda a manter o ciclo circadiano equilibrado e favorece um sono mais profundo e reparador.
Esses alimentos têm efeito estimulante e devem ser evitados à noite, especialmente por pessoas mais sensíveis à cafeína.
Referências
- Lin Y. et al. Association between sleep quality and ovarian reserve. Fertility and Sterility. 2025;123(3):520–528.
- Reschini M. et al. Women’s quality of sleep and IVF success. Scientific Reports. 2022;12:17477.
- Liu Z. et al. Sleep traits and premature ovarian insufficiency. Fertility and Sterility. 2023;120(1):85–94.