Antes de falar sobre o que é a Endometriose, preciso primeiro explicar o que é endométrio. Endométrio é o tecido normal que reveste o útero internamente. Cresce e descama todo mês. Inicia seu crescimento logo após a menstruação e se descama na próxima. A cada ciclo menstrual esta rotina se repete. É sobre ele que os
bebês se implantam. Se a mulher engravidar ele permanece durante a gestação, caso contrário será eliminado no sangue menstrual.
Esse revestimento, muitas vezes, e por razões não totalmente esclarecidas, pode se implantar em outros órgãos:
- Ovários
- Tubas
- Intestinos
- Bexiga
- Peritônio
- no próprio Útero, dentro do músculo.
Quando isso acontece, dá-se o nome de Endometriose (se estiver inserido na musculatura do útero tem o nome de Adenomiose), ou seja, endométrio fora do seu local habitual.
Acredita-se que, no Brasil, existam de 3,5 à 5 milhões de mulheres com endometriose, dentro desses números é estimado que a doença acometa de 10 a 14% das mulheres, em sua fase reprodutiva (19 a 44 anos). Estes dados são suficientes para que se perceba a dimensão e importância deste diagnóstico.
Já está estabelecido que endometriose prejudica a fertilidade. Isso se deve a alterações anatômicas na pelve (às vezes com grande distorção da anatomia), o processo inflamatório provocado (prejudicial ao óvulo, ao espermatozoide e diminui as taxas de fertilização), resistência dos ovários (que necessitam de mais medicação para estimulá-los e produzem menos óvulos), além de alterações endometriais, que prejudicam a implantação (por exemplo secreção de algumas interleucinas, como LIF – leukemia innibitory factor).
A endometriose está presente em 25-50% das mulheres inférteis, e sua ocorrência afeta os resultados gestacionais mesmo com técnicas de reprodução assistida. Representa assim um grande desafio para o especialista em reprodução, pois, se por um lado o tratamento da endometriose aumenta a taxa de gravidez, por outro, pode ser muito agressivo e, em alguns casos, até prejudicar a fertilidade. A decisão de quando operar uma paciente com a doença com desejo gestacional vai depender de vários fatores, principalmente do tipo de endometriose, mas ainda é motivo de muita controvérsia na literatura médica.
A endometriose pode causar infertilidade pelos seguintes efeitos:
- Influencia os hormônios no processo de ovulação, e na a implantação do embrião.
- Altera também os hormônios prolactina e as prostaglandinas que agem negativamente na fertilidade.
- Prejudica a liberação do óvulo dos ovários em direção às trompas.
- Interfere no transporte do óvulo pela trompa, tanto pela alteração inflamatória causada pela doença, como por aderências (as trompas grudam em outros órgãos e não conseguem se movimentar).
- Alterações imunológicas – alterações celulares responsáveis pela imunologia do organismo (células NK, macrófagos, interleucinas, etc.).
- Receptividade endometrial. O endométrio, tecido situado no interior da cavidade uterina, local onde o embrião se implanta, sofre a ação de substâncias produzidas pela endometriose (ILH e LIF –leukemia innibitory factor) que atrapalham a implantação do embrião.
- Alterações no desenvolvimento da gestação. Pode interferir no desenvolvimento embrionário e aumentar a taxa de abortamento.
Entretanto alguns questionamentos devem ser analisados.
Endometriose superficial: em relação a pacientes inférteis com endometriose superficial, apesar de controvérsias, os guidelines da ASRM (American Society of Reproductive Medicine), da ESHRE (European Society of Human Reproduction and Embryology) e do RCOG (Royal College of Obstetricians and Gynaecologists) orientam que as pacientes inférteis com endometriose peritoneal se beneficiam do tratamento cirúrgico por laparoscopia com destruição das lesões. Uma revisão da literatura realizada pela biblioteca Cochrane, em 2010, demonstrou melhoras nas taxas de gravidez espontânea após o tratamento cirúrgico da endometriose superficial.
Esse benefício também parece ocorrer se optado por inseminação intrauterina após a cirurgia, sendo o resultado proporcional ao grau de endometriose encontrado. EM geral, casos de endometriose avançada (grau 3 e 4), as chances de sucesso são limitadas mesmo com cirurgia, sendo em geral optado por fertilização in vitro.
Assim, surge uma outra dúvida: se a paciente com endometriose será submetida a fertilização in vitro, teria beneficio operar antes?
Há poucos estudos que avaliam, com muitas falhas, não sendo possível se chegar a um conclusão definitiva.
Endometriose ovariana: no contexto de infertilidade, estudos demonstraram que a excisão de endometriomas pode aumentar a taxa de gestação em 50% após o procedimento. Por outro lado, a cirurgia pode ser muito agressiva, com perda de tecido ovariano normal e, portanto, com prejuízo da reserva ovariana. Assim, há sempre a grande dúvida se devemos tratar endometriomas em pacientes inférteis assintomáticas.
Um ponto a favor de não operar é o fato de pacientes que foram submetidas a exérese de endometriomas apresentarem diminuição do hormônio antimulleriano em relação àquelas com endometriomas não operados, refletindo um prejuízo de sua reserva ovariana. Além disso, alguns estudos vêm mostrando que a cirurgia melhora a chance de gravidez espontânea, mas, se a FIV já é indicada, não melhora o sucesso da FIV e, em alguns casos, pode até prejudicar.Isso foi demonstrado em dois estudos. Um deles, de Garcia-Velasco et al., em 2004, que avaliou pacientes com endometrioma que necessitavam de FIV. Um grupo (56 pacientes) foi direto para a FIV, enquanto 133 fizeram a cirurgia previamente. O grupo que operou necessitou de mais medicação para a estimulação ovariana e não houve diferença nos resultados da FIV. Assim, concluíram que, em casos de FIV com endometrioma assintomático, ir direto pra a FIV encurta o tempo para se conseguir a gravidez, diminui os gastos e evita os riscos de uma cirurgia, sem prejudicar o sucesso da FIV.
Em 2009, estes mesmos dois autores publicaram uma revisão na revista Human Reproduction orientando que há evidência científica suficiente demonstrando que a cirurgia de endometrioma leva à menor resposta do ovário operado ao estímulo ovariano e sem melhora na qualidade dos óvulos, além de apresentar os riscos inerentes ao procedimento. Logo, não recomendam que seja feita com intuito somente de reprodução, a não ser que haja suspeita de malignidade nos exames de imagem, sintomas associados (dor) ou presença de cistos grandes. Defendem que não há uma indicação específica baseada somente no tamanho para se operar, como a conduta de se operar qualquer cisto com 3 ou 4 cm. Consideram isso arbitrário e sem evidência. A conduta deve depender mais de quanto compromete o tecido ovariano e a localização. Se for possível que os folículos cresçam e sejam aspirados sem lesar o endometrioma, mesmo cistos de 4 ou 5 cm não têm indicação de cirurgia. Já cistos menores, mas que escondem os folículos em crescimento, principalmente em ovários fixos, podem necessitar de cirurgia.
Assim, a tendência atual em casos de endometriose é ser conservador e considerar que o foco da cirurgia deve ser melhorar a qualidade de vida. Em reprodução, os casos devem ser individualizados para se decidir se realmente uma intervenção cirúrgica terá benefício, para não expor a paciente a riscos desnecessários e até mesmo comprometer mais ainda o sucesso reprodutivo. No Quadro 25-2 estão listados pontos a favor e contra a indicação de cirurgia de endometrioma.
Quadro 25-2. Pontos a favor e contra a cirurgia para endometrioma
Vale ainda ressaltar que aspirar os endometriomas durante a coleta de óvulos não traz benefício algum, pois a chance de recidiva é muito grande e apresenta o risco de infeção.
Endometriose profunda: no contexto de infertilidade, se a paciente for assintomática, evitamos a cirurgia pela alta morbidade, principalmente se for indicada a FIV. Neste caso o custo-benefício da cirurgia não compensa.
Independentemente da abordagem cirúrgica, quando a FIV é indicada, uma meta-análise da Cochrane de 2006 mostrou que o uso de agonista de GnRh (aGnRH) por três a seis meses antes da FIV aumentou a taxa de gravidez. Em 2010, um estudo de de Ziegler et al. sugeriu que o uso de pílula contínua por seis a oito semanas prévias à FIV também aumentou a taxa de gravidez, embora seja um estudo não conclusivo.
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