Dr. Arnaldo Schizzi Cambiaghi
Especialista em Ginecologia e Reprodução Humana – IPGO
Apesar da seleção de embriões euploides pelo PGT-A, uma proporção significativa de transferências não resulta em gravidez evolutiva. Este artigo revisa os fatores embriológicos, genéticos e maternos associados à falha pós-transferência, destacando limitações técnicas do PGT-A, influência do preparo endometrial e a importância de novas abordagens diagnósticas e clínicas.
Taxas de falha em embriões euploides
Grandes coortes retrospectivas demonstram que, mesmo após transferência de embriões confirmadamente euploides, as taxas de implantação e nascimento vivo situam-se entre 60–70% após múltiplas tentativas consecutivas. Após o primeiro embrião, não é incomum observar taxas abaixo de 70%.
Índice
ToggleEste ponto foi enfatizado por Lee P. Shulman, MD (Northwestern University, Juniper Genomics), em sua aula “When Euploid Embryos Don’t Succeed” no IVF WorldWide, destacando que a euploidia não garante sucesso gestacional, sendo o fenômeno multifatorial.
Limitações técnicas do PGT-A
Embora o PGT-A elimine a maioria das aneuploidias, limitações importantes persistem:
- Não detecta microdeleções, duplicações sutis ou mutações patogênicas de novo.
- Mosaicismo cromossômico: a biópsia de trofectoderme pode não refletir fielmente a massa celular interna, resultando em baixa concordância interlaboratorial.
Fatores embriológicos
Mesmo entre euploides, a qualidade morfológica do blastocisto é decisiva:
- Blastocistos
- Alterações precoces de clivagem, como blastômeros desiguais, correlacionam-se com maior risco de perda gestacional.
Ambiente endometrial e preparo uterino
- Ciclos naturais de preparo endometrial associam-se a maiores taxas de implantação e menores taxas de aborto em comparação a ciclos substituídos com HRT.
- Espessura endometrial <7 mm está ligada a menor probabilidade de gestação evolutiva.
- IMC elevado e preparo hormonal inadequado correlacionam-se com maior risco de aborto, mesmo após transferência de embrião euploide único.
Histórico de abortamento recorrente
Mulheres com perdas gestacionais recorrentes (RPL) podem apresentar taxas mais elevadas de perda mesmo com embriões euploides. Contudo, estudos contraditórios existem: algumas coortes não identificaram associação estatisticamente significativa, sugerindo a contribuição de outros fatores ainda não totalmente elucidados.
Mutação genética de novo
Sequenciamento trió (pai-mãe-feto) revelou que cada embrião apresenta cerca de 100 mutações de novo de origem germinativa, cuja incidência aumenta com a idade parental.
- Aneuploidias respondem por ~50% das perdas.
- Mutações de novo contribuem para até 35% dos casos.
No total, mais de 85% das perdas gestacionais são atribuídas a causas genéticas do embrião, e não a fatores uterinos.
Sequenciamento genômico integral (PGT-WGS)
Estratégias emergentes, como o PGT-WGS ou “genomic autopsy”, permitem detectar variantes letais não capturadas pelo PGT-A, possibilitando reduzir falhas de implantação e abortos ligados a mutações de novo.
Impacto da biópsia embrionária
Apesar de considerada segura, a manipulação embrionária pode influenciar desfechos:
- Perda celular da trofectoderme: retirada de >10 células associa-se a menor taxa de implantação.
- Estresse celular e alterações epigenéticas: estudos transcriptômicos mostram mudanças em vias de apoptose e diferenciação placentária após biópsia.
- Resposta inflamatória local: pode comprometer adesão endometrial.
- Heterogeneidade técnica: protocolos distintos entre laboratórios geram variação nos resultados.
Implicações clínicas
- Repetir transferências euploides falhadas pode trazer retorno limitado.
- A avaliação deve incluir fatores maternos (IMC, receptividade endometrial, doenças autoimunes), paternos (idade, fragmentação do DNA espermático) e embrionários (morfologia, genética de novo).
- O manejo deve ser individualizado, evitando atribuir todo o fracasso apenas à ploidia.
Conclusão
O insucesso de implantação em embriões euploides reflete um fenômeno multifatorial. A ploidia, isoladamente, não garante sucesso. Limitações do PGT-A, variabilidade embriológica, preparo endometrial e mutações de novo exigem novas ferramentas diagnósticas, como o sequenciamento genômico integral, além de uma abordagem clínica holística e personalizada.
Perguntas e Respostas - Fatores que contribuem para falha de implantação
Porque a ploidia não exclui mutações de novo, fatores endometriais, paternos ou limitações técnicas da biópsia.
Não. Ele detecta aneuploidias, mas não identifica microdeleções, mutações pontuais ou todas as formas de mosaicismo.
Sim. Blastocistos com qualidade inferior apresentam menor taxa de implantação.
Sim. Ciclos naturais tendem a ser superiores aos substituídos com hormônio, e endométrios finos (<7 mm) reduzem as chances de sucesso.
Muitos estudos mostram risco aumentado, embora alguns não confirmem estatisticamente a associação.
São responsáveis por até 35% das perdas gestacionais, aumentando com a idade paterna e materna.
Sim, especialmente se muitas células forem retiradas ou se a técnica não for otimizada, podendo gerar estresse celular e inflamação.
Não. Embora aumente a chance acumulada, não elimina a influência de outros fatores.
Investigar receptividade endometrial, fatores imunológicos, idade paterna, fragmentação espermática e considerar testes genômicos mais avançados.
Ferramentas como o PGT-WGS e análise trió têm potencial para reduzir perdas, oferecendo visão mais completa da genética embrionária.
Referências bibliográficas
Referências bibliográficas
- Management strategies following implantation failure of euploid embryos.
- Association between clinical factors and miscarriage after single euploid embryo transfers. Reprod Biol Endocrinol.
- Are there associations with pregnancy loss following transfer of a single euploid embryo? Reprod Fertil.
- On the reproductive capabilities of aneuploid human preimplantation embryos. Am J Hum Genet.
- A systematic review and meta-analysis of PGT-A diagnostic accuracy.
- IVF outcomes of embryos with abnormal PGT-A biopsy previously refused transfer.
- Kato K, et al. Minimal-invasiveness in biopsy for preimplantation genetic testing. Fertil Steril. 2016;105(6):1522–1528. PMID: 26997237.
- Li M, et al. Single-cell transcriptome analysis of embryos after blastocyst biopsy. Front Cell Dev Biol. 2021;9:658240. PMCID: PMC8076863.
- Capalbo A, et al. Correlation between blastocyst morphology, euploidy and implantation. Hum Reprod. 2014;29(6):1173–1181. PMID: 24626863.
- Shulman, L.P. – When Euploid Embryos Don’t Succeed. Aula apresentada no IVF WorldWide. Professor and Interim Chief, Division of Clinical Genetics, Dept. of ObGyn, Feinberg School of Medicine, Northwestern University; Medical Director, Juniper Genomics.
