Exame genético nos tratamentos de fertilização detecta mutação em genes, inclusive nos BRCA1 e 2, fazendo crescer as chances de nascimento de bebês saudáveis
No dia 14 de maio último, o mundo foi pego de surpresa com o artigo assinado pela atriz e diretora norte-americana Angelina Jolie para o jornal The New York Times intitulado “Minha Escolha Médica”. Nele, revelava, de forma simples e tocante, ter feito mastectomia dupla para evitar o surgimento de câncer de mama. Jolie teve motivos para tomar esta decisão, pois herdou a mutação do gene BRCA1 da mãe, que morreu aos 56 anos de câncer. Ou seja, suas chances de desenvolver a mesma doença eram bem maiores que as de outras pessoas. Provavelmente, ela irá retirar os ovários, pois os genes mutantes também provocam este tipo de câncer.
A possibilidade de uma mulher sem fatores de risco desenvolver câncer de mama ao longo da vida é de 12%. Se pertencer a uma família portadora de mutação genética, o risco, até os 70 anos, salta para 80%. Essas mulheres também apresentam risco muito aumentado de ter câncer de ovário. Nas mulheres com a mutação, o risco sobe de 1,5 % para 40%, pois os genes mutantes também provocam este tipo de câncer e, após ter filhos, é recomendada também a retirada dos ovários por volta de 35 a 40 anos.
Para muitos pode parecer algo extremamente radical por se tratar da retirada de um tecido saudável, mas os médicos não criticaram a escolha da atriz, pois se trata de um caso de extremo risco. O que muitos não sabem é que, atualmente, com o avanço de medicina, já há exames que conseguem detectar a presença de genes mutantes através das células do embrião. Assim, famílias com histórico de doenças hereditárias e portadoras da mutação do gene BRCA 1 e 2, por exemplo, podem recorrer ao exame mesmo antes de engravidar, por meio de uma fertilização in vitro.
O que fazer quando há suspeita da presença de mutações dos genes BRCA 1 e 2? A indicação é investigar famílias com histórico de acometimento de mulheres jovens (<50 anos) que tenham tido câncer de mama bilateral e/ou câncer de ovário. Uma vez identificada a mutação no indivíduo acometido a indicação é investigar toda a família. Diagnóstico genético pré-implantacional (PGD)
O Diagnóstico Genético Pré-implantacional (PGD) é uma técnica utilizada em tratamentos de fertilidade que consiste na retirada de uma ou mais células do embrião (biópsia embrionária) em laboratório, antes mesmo de ele ser colocado no útero para avaliar uma ou mais células com o objetivo de verificar se há anormalidades cromossómicas e/ou doenças genéticas devido a uma mutação de um gene. “Tem sido indicado para casais nos quais a mulher tenha idade avançada ou abortos repetidos e quando um dos cônjuges apresenta anomalias cromossômicas, como é o caso da atriz”, afirma Dr. Arnaldo Schizzi Cambiaghi, diretor do IPGO.
Neste exame, cada embrião, a partir de um ciclo de FIV é testado separadamente. Aqueles com resultados normais podem ser selecionados para a transferência para o útero da mãe. O PGD pode ser realizado tanto no terceiro dia após a fertilização e, neste caso, uma única célula denominada blastômero é retirada de cada embrião; ou no quinto dia após a fertilização, quando algumas células (cinco a oito) do trofoectoderma de cada embrião são retiradas e enviadas ao laboratório para análise.
“Os embriões permanecem no Centro de Reprodução Humana aguardando os resultados dos testes. O IPGO indica a biópsia no dia 5, fase de blastocisto, pois, nesta fase de desenvolvimento, já existe uma seleção dos melhores embriões e, por isso, o exame é mais preciso, uma vez que avalia um número maior de células”, diz Cambiaghi.
É importante ressaltar que apenas 10 % dos casos de câncer de mama são hereditários e que apenas 1/3 destes estão relacionados à mutações dos genes BRCA 1 e 2, pois existem outros genes relacionados e que permanecem desconhecidos. Outro fator importante a se considerar é que o teste realizado no embrião não exclui a possibilidade que a doença surja, apenas reduz esse risco para o mesmo da população em geral.
Diante desse panorama surgem questões como: “Seria ético descartar um embrião apenas pela predisposição de um dia ter um câncer, uma vez que não é certeza que a doença vá se manifestar? Será que daqui a alguns anos esses embriões que carregam o gene BRCA 1 e 2 não poderão ser tratados em vez de, antemão, tirar-lhes a possibilidade de viver?”. Cambiaghi responde: “Por outro lado, se a ciência permite esse avanço, de fazer o diagnóstico de doenças incompatíveis com a vida ou de doenças graves que causam sofrimento ou diminuição de sobrevida, não há razão para não fazer uso dela e por isso o IPGO alerta para a possibilidade deste exame para as famílias acometidas”.
Os exames atuais para o Diagnóstico Genético Pré-implantacional são: FISH (Fluorescence In Situ Hybrydization), a-CGH (Comparative Genomic Hybridization-array) e a-SNP com apoio parental (a-SNP -AP) de 3ª geração. Além dos genes BRCA1 e 2, entre as doenças mais conhecidas que podem ser detectadas pelo exame estão casos de fibrose cística, hemofilia A atrofia muscular espinhal III, hiperplasia adrenal congênita, deficiência de LPL, neoplasia endócrina múltipla tipo 2A e monocromacia haste autossômico recessivo, doença de Huntington, Síndrome de Prader-Willi (cromossomo 15 de origem materna) e diabetes neonatal transitória (cromossomo 6 de origem paterna), as síndromes Russel-Silver, Beckwith-Wiedemann e Angelman.